Wednesday, November 15, 2006

O comportamento e as motivações do Homo turisticus

Dando seqüência ao clipping pré-viagem, achei interessante colocar aqui alguns parágrafos extraídos do artigo "O turismo e a ferrovia" < www.am.unisal.br/graduacao/tur/pdf/tcc-mariaameliamoscom.pdf > que fala sobre uma característica fundamental do "turista" (Homo turisticus): a consciência da duração limitada de sua folga e a intenção de retornar. O turista, ao contrário do nômade, interpreta sua movimentação como uma pausa necessária, mas não pretende e/ou provavelmente não suportaria uma ruptura com o sedentarismo.
Aqui cabe questionar o papel da real dimensão do livre-arbítrio, tanto para o H. turisticus quanto para o aspirante a nômade: ambos sofrem pressão de ambos os lados, tanto o turista que é periodicamente compelido a fugir da condição de ator social, quanto o nômade que é periodicamente forçado a manter vínculos com a sociedade urbana-industrial por causa das necessidades de subsistência. O caráter pendular de tais trocas de estado ocorre provavelmente porque tanto a vida sedentária quando o nomadismo em tempo integral exigem uma carga de energia pessoal tão elevada que tornam a continuidade por tempo indeterminado praticamente insustentável. Quanto ao livre-arbítrio, tanto o turista tem a vontade consciente de representar seu papel social (muitas vezes tacitamente imposto), por considerá-lo necessário para si e para os outros dentro de seu esquema de valores, quanto o nômade vê a necessidade de negar-se a essa representação. É difícil, nesses casos não imaginar até que ponto essas convicções são uma defesa neurótica contra a visão de uma realidade que desagrada, nem imaginar que o pior cego nao é o que não quer ver, mas aquele que só vê o que quer.

------------------

"Cotidiano. Segundo o dicionário Larousse, quer dizer: “aquilo que se faz todos os dias, o que acontece habitualmente”. Por força do comportamento das pessoas, esta palavra assumiu conotação negativa e por conseqüência da palavra o cotidiano também tornou-se negativo, pesado. Ter de trabalhar todos os dias, suportar o tumulto das ruas, correr contra o relógio, expor-se à poluição, agüentar o cansaço, enfim, tudo o que acontece cotidianamente, somente por ser cotidiano é ruim e deve, de tempos em tempos, sofrer uma descontinuidade que possibilite recuperar o indivíduo para que este suporte mais um período exposto a este pesado fardo – o cotidiano. Estas descontinuidades recebem o nome de finais de semana ou férias. Estes intervalos são ansiosamente esperados pelos homens e para que seu manancial de recuperação seja explorado em sua total potencialidade, normalmente, durante sua ocorrência, faz-se uso da prática do turismo nas suas mais diversas especificidade e formas. Jost Kripendorf, em Sociologia do Turismo, diz que “o homem em busca de seu equilíbrio vive o ciclo da reconstituição”, ou seja, “o homem de todos os dias se torna turista para logo após voltar a ser o homem de todos os dias”. Este ciclo propicia aohomem equilibrar suas tensões. O homem de todos os dias de Kripendorf é aquele que sofre as tensões diárias impostas pela sociedade em que atua. Viver convencionalmente traz consigo uma grande quantidade de deveres e posturas a serem cumpridas e apresentadas. “Representar” tal papel durante determinado tempo pode ser absurdamente estressante e isto requer uma descontinuidade de representação, provavelmente, por esta razão, o homo turisticus procura fazer tudo diferente em seu período de férias. Como diriaMarx, “tudo parece estar impregnado de seu contrário”. Também, segundo Enzensberger, foram estes sentimentos antagônicos, entre adorar e odiar o trabalho nascente da Revolução Industrial, que alavancaram a atividade turística nos meados do século XIX. Tanto mais a sociedade burguesa fechava-se, mais seus cidadãos buscavam escapar para viverem o seu contrário como turista. Uma cena comum e até, poderia-se dizer, cotidiana, são os congestionamentos existentes nas saídas das grandes cidades toda vez que anuncia-se um feriado prolongado. A vontade de ausentar-se do cotidiano é tão forte nas pessoas nestes momentos que quase“vemos” tal sentimento materializar-se.
Pensar que este é um sentimento provocado pela atual condição sócio-econômica pode ser enganoso, haja visto ser possível, quando recorremos à história, verificar estes mesmos movimentos e sentimentos desde os tempos da pré-modernidade ou início da era moderna. O comportamento do homem romântico, que foi agente determinante para o advento da chamada modernidade, era predominado pelas emoções, com grande preocupação para o subjetivo que propiciava profundas reflexões. Com as Revoluções burguesas o indivíduo com as características do homem romântico tomou consciência da liberdade. Liberdade esta, que estava sendo tolhida pelas conseqüências deste mesmo processo revolucionário. O mundo do trabalho e a estruturação política do momento ameaçavam sufocar a liberdade recém incorporada. Esta ambigüidade fez o homem moderno, já sufocado pelo trabalho, libertar-se através de sua imaginação “criando” sinônimos de liberdade representados pela imagem das paisagens, situadas distantes da chamada civilização ou aglomerados urbanos – as cidades. A classe burguesa cada vez mais procurava ausentar-se dos centros em direção à natureza e ao exótico, buscava os campos, as montanhas, as praias. Era preciso buscar o intocado, pois o intocado havia tornado-se uma mistificação ideológica. Nesta época, as características capitalistas já delineavam-se, e o desejo de consumo da visita aos locais “libertadores” era visível. Thomas Cook aproveitou-se deste sentimento e, em julho de 1841, realizou uma viagem entre Loughborough e Leicester para os membros de uma associação de abstêmios. Quatro anos após, fundou sua agência de viagens e em 1845 organizou a primeira viagem em grupo para diversão turística. Iniciava-se assim, o turismo para grandes grupos ou a produção em série do turismo. Com o desenvolvimento do turismo, também, para a pequena burguesia, as imagens remotas eleitas no romantismo como representativas da natureza e da história cristalizaram-se em Zoológicos, Jardins Botânicos e Museus."

1 comment:

Anonymous said...

necessario verificar:)