Tuesday, December 19, 2006

Dia 15 - Curitiba, PR - 1.076km (00)

E aí, Galera!

Como havia dito, no sábado à noite houve um evento organizado pelo Roberto Bikeline, o Grande Desafio 2006, para encerrar o ano, com largada à meia-noite, percurso de 130km com algumas subidas e estrada de chão, e participação de uns 50 ciclistas.
Fui para a frente da loja, e aos poucos começaram a se reunir inúmeros ciclistas vindos de tudo que é canto, e arruma daqui, cumprimenta dali, eu de longe olhando, anota nome na ficha de inscrição, enche caramanhola, e eu tonto de sono, aí puxei papo com um, com outro, já me perguntaram se eu ia participar sem camisa mesmo (estava quente), quando de repente, como não poderia deixar de ser, resolvi participar, azar.



Estava cansado, mas a oportunidade de pedalar em grupo, com um monte de gente desconhecida (até algumas meninas muito queridas, se é que me entendem), por um trajeto digno do nome "desafio", era algo imperdível.
Fui correndo lá dentro, tirei os alforjes, barraca, corrente, bolsa de guidão, calcei a sapatilha, botei a bermuda, uma camisa de ciclismo, luva...
Ao fazer um pseudo-aquecimento, vi que algo estava muito, mas muito promissor: a bici sem as bagagens parecia pesar uns 5kg ao ser pedalada, simplesmente voava! Uhu, isso vai ser divertido.
Na largada, a tripa toda enfileirada sob o comando do Roberto. Por alguma razão, talvez empolgação, alguns (incluindo eu) foram na frente, e por um mal-entendido pegaram uma esquina errada. Na volta para o caminho certo, um dos participantes caiu sobre uma corrente que cercava um posto de gasolina, nada grave, mas o Roberto, obviamente, sentou o xixi na galera, o que bastou para que todos ficassem logo bem mansinhos e controlados. Tomamos o asfalto em direção a Campo Largo, e logo me posicionei entre os ciclistas que estavam na frente, e fomos indo, numa seqüência de subidas suaves e descidas suaves, com uma média até bem alta, parando eventualmente para esperar a galera.
Mais adiante, tomamos uma descida com piso de cimento, onde, coisa nunca antes vista por estes olhos cansados, presenciei o espetáculo (ai, que meigo) de dúzias de luzes azuis dos leds das bikes, enfileiradas em fila indiana, desenhando as amplas curvas do caminho, em alta velocidade (isso porque eu estava lá na frente, olhando para trás, como eu sou bom, huehue). Depois, umas descidas de estrada de chão, onde a galera ficou me tirando pra loucão, devido ao uso modesto que eu fazia dos freios, ultrapassando o pessoal a milhão e por vezes (mas com segurança) tirando fininhos.
A primeira das fortes subidas na estrada de chão, enquanto tinha gente descendo para empurrar, subi pedalando de pé, a uns 20 por hora ou mais, ô coisa boa. Mas logo em seguida morri, e voltei a pedalar sentado, numa marcha bem leve, botando os bofes pra fora, devagarinho.
O trecho noturno se estendeu por intermináveis curvinhas e pontezinhas e baixadas em meio a sítios, até que chegamos a uma pequena vila, chamada São Luís do Purunã, com ruas de paralelepípedos e casas com decoração de lugar turístico (que era, mesmo). Neste momento, começou a ficar mais nítida uma certa neblina, um sereno mais grosso, com um vento frio, e seguimos, cansados, visto que vínhamos eu e mais uns cinco em um ritmo puxado pela estrada de chão, tentando achar o caminho para a pousada onde seria o café da manhã. Após pedalarmos sofregamente pelas últimas subidas do caminho, e nos embaralharmos com algumas placas confusas, achamos a entrada, pulamos uma porteira de madeira, e descemos por uma serpenteante e indefinida estradinha rodeada de enormes Pinus, até chegar no salão do café da manhã, que estava, obviamente, ainda fechado. Sabendo que o café estava marcado para as seis e meia (eram cinco e pouco), deitei em uma rede que havia por lá, e tirei um cochilo.
Acordo com o pescoço doendo, as costas muito, mas muito geladas, e o ruído de uma porta sendo aberta e de uma voz feminina dando bom dia. Aos poucos, me levantei, juntei a tralha que havia largado no chão coberto por agulhas de Pinus (inclusive a sapatilha), e fui caminhando de meia mesmo, até uma das cadeiras do salão, enquanto o pessoal já ia se acomodando e as moças iam preparando o café. Logo, chegaram mais ciclistas, e o salão rapidamente ficou recheado do rumor provocado pelos ciclistas famintos, sonolentos, cansados e com frio, o que não impediu que continuassem animados a ponto de rapidamente surgirem com algumas garrafas de cerveja em punho (alguns, somente alguns).
Ao ser servido o café, a fila que se formou foi tão grande, que preferi conviver mais um pouco com a sensação de estar pegajoso, com os intestinos paralisados pelo esforço acumulado e pelo horário inusitado, em dúvida quanto à oposição entre a necessidade e a capacidade de comer o máximo possível. O tempo foi passando, e percebi que a fila não diminuía, só mudava de personagens, então resolvi fazer algo produtivo e, após alguma espera, peguei lá uns bolos, pães, cucas, sucos e café com leite. Para arrematar, após algumas visitas ao banheiro para estabilizar o peso, uma xícara de café preto com açúcar, e uma esticada em um banco de tábua, que já estava claro na rua e a galera estava com cara de quem queria partir logo.
Optamos por ir pelo asfalto, o que foi uma idéia esperta, já que mesmo àquela hora era fácil perceber que o dia seria muito quente. Após uma brusca arrancada pelo caminho de acesso à pousada, no sentido do asfalto, e uma tocada forte declive acima com a esperança de alcançar os líderes do pelotão, fui forçado pela falta de condições físicas a rever meus conceitos e considerar mais positiva a idéia de ir acompanhando os últimos (e últimas) do pelotão.
Isso foi uma boa idéia, pois pude conversar com mais gente, me desgastar menos, parar inúmeras vezes, aproveitar o passeio por mais tempo. Ao chegarmos finalmente de volta à casa do Roberto, já em menor número (na verdade eu e uma moça muito simpática, chamada Luciane, e um outro rapaz que não me lembro o nome), acompanhados pela Celsis no carro de apoio, tomamos rapidamente um banho e fomos à churrascaria Ripa & Costela, onde houve a entrega dos "brevets" de Imortal (aqueles que não morreram durante o passeio), regada a muita bebida e comida.
De volta ao lar, já bem alimentado, ainda pude contribuir de forma bastante proveitosa para a limpeza dos cães, sendo que isso foi feito com mangueira, balde, escova e xampu, no pátio, servindo também para refrescar a mim e à Celsis - os encarregados da faxina canina. Não muito depois disso, e antes das cinco horas da tarde, quero crer, fui me deitar um pouquinho, e me acordei às onze e meia do dia seguinte.

Estava me sentindo um bagaço. Cara inchada, preguiça absurda, calor, moleza. Almoçamos um rigatoni com molho de atum e maionese com ervilhas, coisa muito fina, e tivemos sorvete como sobremesa. Em seguida, voltei a dormir até começar a escurecer, momento em que se formou uma nuvem de chuva bem grande (maior que Curitiba, na verdade) e choveu um pouco. Depois de passada a garoa, tive a péssima idéia de ir ao supermercado tentar comprar os víveres de que necessitaria na quarta feira, mas o choque cultural de entrar em um super-hiper-mega-monster-mercado depois de semanas na estrada me deixou com brotoejas de aversão, de modo que saí correndo. Jantei num rodízio de pizzas e dormi perto da meia noite.

Hoje (terça) acordei também onze e meia, almoçamos uma e meia, fiquei um tempo na oficina do Roberto ajudando a montar umas rodas, depois fiz uma longa caminhada até um super mercado, onde contraí novos laços matrimoniais com um kit copa-queijo-goiabada, que, espero, me serão fiéis até que a morte (deles) nos separe - desta vez, queijo Samsoe, que chique!
Comprei um baguete e um suco de pêssego, que consumi como lanche no banco da praça em frente ao super, e voltei preguiçosamente até a oficina, já com os pés doendo pela falta de costume em andar de havaianas (Ballina, aliás, não são as legítimas, vai ver foi isso). Jantei um xis com suco de polpa de morango, escrevi isto, e agora tomarei banho e nanarei, que amanhã a rotina rodoviária retornará à minha vida pseudo-nômade.

Abraços, até mais!

5 comments:

Anonymous said...

É meu camarada, relativiza tua super-homenidade, às vezes é bom recuar um pouquinho até a realidade dos mortais e, principalmente, das mortais.

Abraço e bela seqüência!
Gonzalo.

Anonymous said...

Cara, se tu fores passar por Londrina te dou o contato da Amanda pra fazeres um rango ou coisa do tipo hein, é só avisar!

Gonzalo.

Anonymous said...

Aê, Helton, passei a acompanhar suas aventuras depois que vi sua msg na lista bike(yahoo). Não tive tempo de ler todos os posts ainda, mas percebi que você escreve muito bem. Parabéns, tou torcendo por você. Eu também estou planejando uma cicloviagem, e certamente ver você fazendo é um estímulo a mais. Abração!

Anonymous said...

Eu tinha certeza que vc não ia resistir a participar do evento dos "Imortais"....
Afinal terra e serra,dificil dizer de qual vc gosta mais...hehehehhehehe

Que a tua viagem continue boa e divirtida!!!Cuidado para as subidas infinitas não te deixarem neurotico;jagunços?esquartejadores?kkkkkkkk

abração,ninki

FarAmiR said...

Se você ficou com brotoejas ao entrar no mega-boga-monster-mercado, imagine as pessoas que viam um troglodita barbudo, mal encarado saindo correndo desesperado de lá..
Isso sim é assustador..

Abraço